sexta-feira, 13 de novembro de 2009

XICO SÁ AMA UM VESTIDO ...

Xico Sá*/Especial para BR Press

(BR Press) - Quem tem medo de um par de pernas desavergonhadamente à mostra? Calma, moça, calma, meu rapaz! Este cronista retardatário não vai gastar os seus bêbados perdigotos de tiozinho "lóki" ainda tratando sobre o caso da universidade bandeirantes, talebans e de outros tantos enrustidos Borba Gatos.

Sossega, menina Geisy, prometo não fazer mais uma pecaminosa lavagem de roupa suja e encolher ainda mais o seu honesto vestuário nesta sexta-feira, 13.

Tampouco vou ficar com essa cara de marido que não gostou nada do que a patroa anda usando nas festas da firma - vestida para matar inclusive o mais moralista chefe do almoxarifado.

Pera lá, muito pelo contrário. Viva o V de vingança de todos os micros, médios e macros vestidos.

Tubinhos, pretinhos básicos, com e sem alça, os brejeiros de chita. E o tomara-que-caia, amigo, você já testemunhou a queda de pelo menos uma alça dessas na vida? É lenda. Por mais que a gente seque, nunca vi uma peça do gênero despencar na minha frente. A Lin, uma amiga, diz que sim, cai mesmo, já foi vítima. Duvido!

Ei, você aí, de cabelos brancos na fronte do artista... Você mesmo, rapaz, deve se recordar muito bem daquele que Sônia Braga vestia quando escalou o telhado, em Gabriela Cravo e Canela, lembra?

Alvíssaras, meus camaradas, os vestidos voltaram com tudo. A vingança. Não que tivessem sumido da história, das ruas, das festas, repartições e corredores universitários. Mas andavam em baixa, suplantados pela praticidade burocrática das Evas modernas e suas calças, suas saias austeras e seus tailleurs, essas peças apolíneas que batem a carteira de Vênus, roubam a alma de Eros...

De tão gananciosos e neoliberais, os tailleurs são capazes de sair sozinhos para o trabalho e bater o cartão de ponto.

Redenção

Salve o caso do vestido para realçar o que já era tendência no mundo das passarelas. Estranho, porém bueníssimo quando até a moda começa a entender um pouco os homens héteros. Assim paga e se redime de todos pecados anteriores. Redime-se lindamente do quanto enfeiou as belas mulheres nas últimas décadas, como pregava o tio Nelson.

Nada nos cai tão bem ao desejo quanto um vestido.

Todo homem que é homem ama passear com uma mulher com a mais linda dessas peças. Mesmo os mais machões, que fingem ignorar a vestimenta da fêmea - reservando-se apenas a dar chiliques quando as vestes são muitas curtas.

Seja um Versace, que custa os olhos da cara, seja um baratinho de chita.

Homem que é homem, seja de Paris, Nova York ou do sertão dos Cariris, como o meu avô João Patriolino, vai à Maison ou à feira e traz uma bela peça de presente para a amada. Até mesmo o Fabiano, que mal tinha um cobre no bolso, personagem do livro Vidas Secas, de Graciliano Ramos, voltava da cidade com um corte de pano estampado para cobrir só o couro e o osso da sua mulherzinha querida.

V de vestido, decotes de todos os ossinhos, para deixar mais faceiras as gazelas, dar mais graça e maciez às cheinhas, realinhar a beleza nobre das afilhadas de Balzac, faiscar a brasa das cinquentonas e mergulhar as sexagenárias no banho de loja como se saltassem felizes na piscina de Cocoon, o filme.

A peça nos põe, homens de todas as gerações e gostos, mais românticos. O mais tosco dos canalhas sucumbe como um romeiro de joelhos diante de uma santa.

& MODINHAS DE FÊMEA

Ora, nem carece ser a mais bela por completo - isso é utopia e ditadura de modinhas, você precisa ter apenas uma linda parte pelo todo, como aquela figura de linguagem, a tal da metonímia que aprendemos no colégio.

Mulher é parte pelo todo. Uma linda omoplata, um pescoço, ombrinhos, calcanhares mais lindos, batatas de pernas invejáveis, belos braços...

Aí ficará ainda mais linda de vestido. O charme da hora é mostrar-se, ter a manha, a coragem, mesmo com o que você supõe ser uns quilinhos a mais. Na balança das nossas retinas e trenas, isso pode ter importância de menos, quase nada, alguns gramas de preconceito e frescuras na cabeça de homens que já não valiam a pena mesmo.

Perdão, leitora de sempre, mas sou obrigado a repetir, ad infinitum, meu velho mantra: homem que é homem, acredite, não sabe a diferença entre estria e celulite.


Xico Sá, 46, é autor de "Modos de macho & modinhas

de fêmea" entre outros livros. Nasceu no Crato, Cariri,

cresceu no Recife e hoje ronda a noite paulistana em

busca de fábulas e crônicas. Fale com ele pelo e-mail

xicosa@brpress.net

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